Multipropriedade ganha força no litoral do país
Modelo ‘multifamily’ em condomínios ou hotéis de luxo nas badaladas praias brasileiras vira tendência e facilita acesso à segunda residência
O sonho de ter uma casa na praia ficará mais próximo da realidade dos brasileiros em virtude do crescimento do mercado de multipropriedade no litoral do país. O modelo permite que pessoas adquiram frações de imóveis de lazer e possam usufruir do bem por uma quantidade de dias ao ano.
Na Região Nordeste, por exemplo, seis empreendimentos desse modelo de negócio abriram suas portas no ano passado, elevando em quase 40% a oferta de unidades habitacionais com essa finalidade. A chegada de marcas hoteleiras internacionais também tem fomentado o setor, com inaugurações previstas para acontecer já no segundo semestre deste ano.
Embora esteja associado à emoção de passar as férias com os pés na areia, o grande apelo do multifamily na praia é puramente racional: ser dono de uma propriedade pagando apenas uma fração do preço total e diluindo gastos de manutenção e tarifas condominiais com os demais cotistas.
“A vantagem econômica e de experiência de uso do imóvel é muito superior se comparada a um hotel ou casa de aluguel por temporada”, afirma Fábio Godinho, sócio-fundador da My Door, startup que intermedeia a comercialização de frações de propriedade em praias do litoral paulista.
Em Paúba, no litoral norte de São Paulo, multiproprietários da My Door podem sublocar suas casas para abater custos condominiais ou obter renda — Foto: ANDRÉ MORTATTI/DIVULGAÇÃO
Segundo o executivo, apenas 2% dos brasileiros têm uma segunda residência para lazer — e o tempo médio de ocupação do imóvel por ano é de 45 dias. “Não faz sentido comprar uma casa para usar tão pouco, ainda mais em tempos de juros altos”, avalia.
A startup entrou no segmento em 2022 e hoje tem 22 imóveis no portfólio — em geral, casas de luxo em condomínios, que são divididas em oito cotas. Os valores variam de R$ 185 mil a R$ 2 milhões, conforme a localização e o tamanho dos imóveis.
“O comprador pode usar a casa 44 dias por ano, e oferecemos um serviço de concierge que cuida de tudo: da compra de alimentos à contratação de cozinheiro ou passeador de cachorro”, informa Godinho.
A My Door tem opções fora do litoral e na Bahia (Praia do Forte). A meta deste ano é expandir a carteira para outros destinos como Trancoso (BA) e Ilhabela (SP).
“O mercado de segunda residência no Brasil deve representar R$ 500 bilhões e vem crescendo mais de 10% ao ano há uma década. Mas é muito fragmentado, e isso abre espaço para a atuação de grandes players”, conclui.
NORDESTE CRESCE
“O Nordeste vem crescendo fortemente e tem potencial turístico imenso, devendo ultrapassar o Sul nos próximos anos”, aposta Caio Calfat, fundador da consultoria e presidente da Associação para o Desenvolvimento Imobiliário e Turístico do Brasil (Adit Brasil).
Conforme o último relatório “Cenário do desenvolvimento de multipropriedades 2022”, da Caio Calfat Real Estate Consulting, a Região Nordeste conta com 183,8 mil frações de propriedades (lançadas, em construção e entregues). Em termos de oferta, a região só fica atrás do Sul, que lidera com 221,9 mil cotas.
m meio à reserva de Mata Atlântica nativa, o hotel Vivant EcoBeach Resort oferece cotas de apartamentos e bangalôs por R$ 69,9 mil, financiados em até 180 prestações — Foto: VCA/DIVULGAÇÃO
Apenas no ano passado, foram seis novos empreendimentos, somando 1,8 mil unidades residenciais, a maioria localizada na faixa litorânea. O VGV foi de R$ 3, 4 bilhões.
Diversos empreendimentos vêm surgindo na região, visando explorar as belezas naturais dos mais de 3,3 mil quilômetros de praias. Na Bahia, a VCA Construtora investiu R$ 80 milhões para lançar o Vivant EcoBeach Resort na Península de Maraú, em Barra Grande.
A operação hoteleira conta com 48 unidades, e outros 28 apartamentos e bangalôs serão adicionados à oferta em março, dentro do modelo de multifamily. Cada um será fraccionado em 26 partes, com direito a 14 dias de uso por ano. O valor da cota é de R$ 69,9 mil, que podem ser financiados em até 180 meses junto à própria construtora.
O comprador poderá ainda intercambiar seus dias com a operadora RCI ou alugar por temporada sob administração da Livá Hotéis, que faz a gestão do resort. “É uma oportunidade para clientes que buscam ter uma casa na praia com as comodidades de um resort”, explica Jardel Couto, CEO da VCA.
Marca internacional chega para agitar o mercado
Neste ano, gigante hoteleira global inaugura resorts com multipropriedade em Fortaleza (CE) e na Ilha do Sol (PR)
A piscina do Hard Rock Hotel Ilha do Sol: praia em represa receberá o primeiro resort com multipropriedade da gigante internacional no Brasil — Foto: VCI/DIVULGAÇÃO
Oferecer um produto multifamily com serviços e atrações da hotelaria internacional é a estratégia do grupo VCI S.A. para conquistar clientes de classe média alta que estavam à margem do mercado de segunda residência no país.
Para tanto, a empresa fechou parceria com o grupo Hard Rock Hotels, com sede nos Estados Unidos, e será responsável pela chegada da marca ao Brasil. Até dezembro, dois empreendimentos serão inaugurados: em Fortaleza (CE) e na Ilha do Sol, na Represa de Capivara (PR).
Cada apartamento será dividido em até 25 cotas, com preços entre R$ 120 mil e R$ 250 mil, parcelados em até 60 meses. O uso máximo permitido por fração é de 14 dias. “É um imóvel que cabe no bolso, com qualidade de hotel cinco estrelas”, acredita Samuel Sicchierolli, presidente da VCI.
Os dois hotéis custaram R$ 1,2 bilhão e têm VGV de R$ 1,6 bilhão. Neles, os futuros coproprietários poderão usufruir de piscinas com música subaquática, restaurantes, bares, quadras esportivas e apreciar diversos itens originais de astros do rock’n roll mundial.
Na esteira dos próximos lançamentos estão Jericoacoara (CE), Recife (PE) e Na-tal (RN). Campos do Jordão, no interior paulista, também está na fila. Os projetos estão em fase de captação de recursos e aprovações técnicas e ambientais.
Para Sicchierolli, o modelo de multifamily eliminará um problema recorrente nos resorts brasileiros: a perda de receita pela baixa ocupação média, impactando na manutenção de equipamentos e no padrão dos serviços.
“A multipropriedade ajudará a manter elevada a ocupação do empreendimento, permitindo que seja mantida uma infraestrutura de qualidade acima da média”, afirma.
Já a chegada de marcas internacionais ao segmento no Brasil é defendida pelo executivo. “Acredito que seja uma tendência positiva porque qualifica nossas cidades, profissionaliza a mão de obra local, melhora o atendimento e coloca aquele destino no mapa do turismo mundial.”
Fonte: Valor Econômico